Matéria publicada na Adital, 22/04/2010
Quando os Mapuche conseguiram por as mãos em Pedro Valdívia, o levaram para uma de suas aldeias. Primeiro cortaram suas orelhas e seu nariz, para que se recordasse de todos os narizes e orelhas que cortara dos Mapuche e despachara em cestos rio abaixo para exibir sua crueldade. Em seguida, num ritual solene, acenderam uma fogueira e o assaram brandamente, retirando e comendo pequenas lascas de carne assada do conquistador Espanhol.
Finalmente, derreteram um pote de ouro e despejaram garganta abaixo de Valdívia, para saciá-lo da sede de ouro que possuía, motivo fundamental de suas chacinas sobre os Mapuche.
Esse é, em outras palavras, o relato que nos faz a escritora chilena Isabel Allende, em seu livro "Inés de Minha Alma", onde relata a conquista do território chileno por Pedro Valdívia. Os Mapuche mataram Valdívia, com vingança cruel e requintada, mas perderam a guerra. Hoje há um punhado de Mapuche que resiste em território chileno. Uma Bíblia foi o pretexto para Cortés massacrar os Astecas. O ouro foi motivo para Pizarro dizimar os Incas; para Valdívia, arrasar os Mapuche. Em nome das terras, da fé e do ouro os portugueses dizimaram os índios brasileiros. Sobraram alguns, poucos, como na região do Xingu.
Quando eles pensavam que iriam ter paz, uma hidroelétrica, um presidente, uma candidata a presidente, as corporações nacionais e transnacionais, em nome do progresso, do desenvolvimento, da segurança energética -mas, poderia ser da Bíblia, do ouro, ou qualquer outro pretexto- vão dizimar o que lhes restou de espaço na sua turbulenta história.
São as leis da história e do progresso, não é mesmo? Afinal, como disse um jornalista da TV, "ou se devolve o Brasil aos índios, ou se pensa nos outros 195 milhões de brasileiros".
O capital tem seus deuses e sua voracidade. E eles pedem sacrifícios
contínuos dos povos, nesse caso os indígenas, em qualquer época da história. Quando se perde o sentido do humano, sempre há um argumento para justificar a crueldade, seja contra a natureza, seja contra a pessoa humana.
* Agente Pastoral da Comissão Pastoral da Terra
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